Ao sair da sala, vou direto aos telefones públicos. Precisava mesmo falar com alguém. Mas quem?
Não posso entender o que provocou essa latência repentina no meu olho direito. Ao checar no espelho o porquê do incomodo, percebo minha íris esvaindo-se por uma rachadura e penso que vou ficar cega. Ou já estou?
Direto ao hospital, urgente. Preciso me internar e consertar essa "coisa". No quarto, aguardo o resultado do exame. A cama é de casal. Estranho. Mas deve ser por isso que meu amor está ali, ao meu lado, segurando minha mão.
Há quanto tempo... mais de 6 anos...nunca pensei que estaríamos assim novamente. Agora que de volta é como se nunca tivesse ido. E nisso uma vontade de amar como nunca. Fiquei com receio de que a enfermeira aparecesse. Pára tudo. Por sorte.
Lá está ela na porta. Me assusta a forma como me olha. Corre e se deita ao meu lado. Que significa isso? É o médico! Está bêbado? Está louco? Sai! Onde está então agora o meu amor?
O diagnóstico, segundo ele: meus olhos estão perfeitos. O problema é a cirrose. Alguma coisa está errada por aqui. Talvez eu esteja confundindo as coisas. Como o personagem do Campos de Carvalho que pensa estar num hotel de luxo durante toda a vida em hospício.
Mas preciso salvar minha visão. Meu olhar. Que há? Corro desesperadamente por todo hospital já então duvidando de que é mesmo um hospital. Uma senhora segura um exame. Questiono a enfermeira sobre o meu laudo. Ela nem me olha.
- Essa senhora está com câncer na próstata, veja bem. - ela diz.
- Não se preocupe, senhora. O câncer é a evolução natural da próstata. - respondo me direcionando à velha abatida.
A enfermeira apenas balança-me a cabeça. O prédio é antigo. E tem aqueles janelões. Isso me chama a atenção de repente. Faz uma noite linda lá fora. Noite de Lua Cheia.