quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Dialética II

Não. Ele até que não era antipático. Ao contrário, o marido da enfermeira louca era até bastante solicito. Ofereceu carona para que buscássemos o lanche da tarde e uma bombona nova. 

Entrei no carro. Botei o cinto.

 - Pra que isso, guria? Não confia em mim? - disse ele apertando o botão e retirando o (meu) cinto.

Medo.

No caminho, fiquei um pouco constrangida com a teia de elogios que ele ergueu à minha pessoa seguida de 

 - Tu viu, né? Minha mulher não é ciumenta.

Mais essa agora...cortei.

 - A questão é que eu é que não gosto de interferir em relacionamentos alheios.

 - Claro...é...mas não to dizendo nada demais né...só que tu é uma mulher bonita e...

Parou o carro. (ain...help!) 

 - Só vou pegar a água aqui.

Baixou o (meu) vidro, e, se escorando por cima de mim, pôs-se a chamar o vendedor.

(Tá bom aí, queridinho?)

Seguimos e ele me conta como conheceu a esposa. Me fala que é mestre de obras (não confunda a obra do mestre Picasso com...), que está na cachaça desde de manhã (ah!) e que por pouco não correu todo mundo do set (oi?).

E lá vamos nós (outra vez). 

De 1 a 10, qual a probabilidade do ator do meu elenco ter tido um caso com a dona da casa?

Horas de desabafo depois, retornamos.

 - Conversamos melhor a sós mais tarde?

 - Bah, que pena! Mil coisas pra resolver no set...hehe

Escolhendo locações assim, viro PHD na arte do discurso. 

 

Dialética I

Talvez a enfermeira louca não estivesse esperando que sublocar sua moradia para o cinema significasse ver suas paredes cobertas de pó de café; seu quarto, de lixo, e sua mesinha da TV, de vermes. Prometemos que tudo voltaria ao normal ao fim da filmagem, mas já no segundo dia ela se recusou a nos deixar entrar.

Lá vou eu. Após 1h, consigo a liberação sem sequer imaginar que passaria o dia todo exercendo meu poder dialético. Sim. Ela queria atenção. Sim. Ela tinha muitas opiniões acerca de como a filmagem deveria estar sendo feita. Não. Ela não compreendia porque aqueles 'jovenzinhos' não ouviam o que ela tinha a dizer. Afinal, ela havia estudado enfermagem na África (uau!) e sabia muito melhor do que eles o que eles tinham que fazer ali.

Respiro fundo pra conter o riso.

 - Olha, Dona Efigênia, sabe como é, eles são muito jovens, impetuosos e arrogantes. Mas me conte mais (suspiro) tenho a certeza de que o diretor vai gostar de suas idéias (aham!). Fala pra mim que eu repasso tudo pra ele.

- Logo se vê que você entende mesmo do assunto. Veja bem, por exemplo, porque e menina fica cantando vestida, chorando dentro da banheira. Isso não é coisa de gente certa...

- É que Bárbara está deprimida, Dona Efigênia...

- Ah! mas vocês deveriam fazer uma comédia...ninguém gosta  dessas coisas tristes

E lá vamos nós. 

Passamos o dia todo conversando, inclusive durante o almoço e, depois, seguimos sentadas na cama que ela armou na banheira enquanto rodávamos no quarto. Já cansada, peço licença para providenciar o lanche da tarde e mais água pra equipe.

- Olha, menina! Aproveite que meu marido vai ter que sair e pegue uma carona!

Confesso que nem havia percebido a presença do cara. E até que não me pareceu uma má idéia, visto que, nessa produção independente, o responsável pelo transporte quase chorava toda vez que tínhamos que sair com o carro e pedia mais e mais gasolina.

- OK.

E eu que achei que minha dialética já havia atingido o ápice... 

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Borracha en la Playa

Esta noite vi a lua de perto com o impulso da cápsula. Bebendo assim, posso acabar como a Estamira. 'Alô, alô, Terra chamando Exú'. Mas, pra não perder o costume, me atiro na beira e já rebato a ressaca com a 'caipa' que trouxe na leiteira da pousada (espero que os demais não queiram tomar café com leite quando acordarem).  

Dois cachorros disputam um tronco enorme e não dão sossego aos visitantes do quiosque, onde deito para fugir do sol e descubro um drink maravilhoso de rum, limão e manjericão que vai entrar pro hall da jacaroagem. Certamente. 

E os cuscos seguem latindo, arranhando a perna dos turistas no desespero pra que alguém atire o bagulho longe de novo. Cada um que passa perto é o próximo Cristo. Eu, já desde manhã cedo na praia, sou uma das que se diverte com a cena hilariante. O labrador percebe minha complacência e deita-se ao meu lado de barriga pra cima. 

Não sei porque os cachorros me perseguem. Nas areias uruguaias, vulcânicas gregas, nordestinas bucólicas. Dentro do carro, no banco do carona. Parece que o lance é comigo. Devem sacar minha simpatia "modesta". 

Pois é. Acho que serei obrigada a sair da minha inércia e exercitar meus bracinhos atirando o semi-tronco longe pro meu mais novo amigo aqui me trazê-lo de volta. Quem sabe assim ele não me paga mais um daikiri já que meu dinheiro acabou. Hic, hic! Fui! 






terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Receita de uma Divina Comédia

Crie uma  base 
À La Muhamed
Abra as janelas
E libere a mesa para os coquetéis

Receba sua homenagem
Erga o volume
Liberte seu clown
Num brinde à lissergia
E encha as taças com risadas

Derreta no tapete
Mas não deixe de posar para a foto
Perca o céu dentro de casa
Substitua os aplausos por estalar de dedos
E no dia seguinte 
Repare nos hematomas 
E retire a louça suja de dentro do armário


sábado, 19 de dezembro de 2009

Bizarrices de um Trabalho Sórdido ou Trabalhices de um Sarralho Bizórrido

Calculo que dormi 2h em 2 dias. Troco os cataventos e algodões doces pelo arame farpado e acordo de madrugada com medo de perder os origamis na chuva.

Os sabiás me brindam merda! 2 vezes. Fico na dúvida se é um desejo de sorte ou uma vingança em nome de todos os passarinhos que assassinei na infância. E, aliás,  sem entender porque a porta não fecha, também quase mato o gato. 

Me mandam quebrar a perna e acabo com uma espica no halux. E enquanto o quinto não segura a ovelha (que cena memorável!) e os risos ficam presos no nariz, os outros quatro me pedem em casamento. Será que a sordidez masculina começa aos 10? (Nossa que forte isso...mas combina com o título...)

De volta à civilização, busco baixar a adrenalina e sigo os conselhos da negra. Me dirijo ao centro em busca do senhor que vende lexotan a um real. Localizo-o com dificuldade em meio aos demais gritos de Fabricalcinha e Cortacabelo, mas finalmente o encontro. 

Quando chego mais perto, me deparo com abanadores made in China e descubro que são os leques que só tão um real. Só me resta a cachaça...